Que balanço é que faz da época prestes a terminar, a qual foi, ainda, sobremaneira condicionada pela pandemia por Covid-19?

O balanço foi deveras muito positivo, com muito tempo despendido em prol do futebol e futsal, mas com os objetivos a serem cumpridos. Encontrámos todos os nossos campeões e conseguimos dar brilho às competições que organizámos. Fomos campeões de sub-17 e sub-16 de seleções de futebol e ficámos em 2º lugar nos sub-15 e sub-13, vencendo também no futsal, no Torneio Regional Interilhas, em sub-13, jogado na ilha das Flores.    

Encontrar uma solução para o Campeonato de Futebol dos Açores foi, porventura, o processo mais desgastante que enfrentou?

A solução para o CFA já estava identificada há algum tempo. Aliás, até os regulamentos eram muito claros neste processo, o único receio que eu tinha era que o CFA terminasse antes da conclusão da primeira volta, aí teríamos novamente o mesmo filme da época passada, ou seja, a prova seria anulada e recomeçada na próxima época, onde os campeões das associações voltariam a não subir, o que seria catastrófico para os campeonatos de ilha.

Como é que explica o constante avanço e recuo por parte de alguns clubes em relação a esta matéria?

Cada clube procura defender os seus interesses. É estratégia. No entanto, avisei sempre, e desde o início, que o CFA só podia parar quando a primeira volta estivesse concluída, e que não iria acontecer o mesmo do ano transato. Cheguei a receber telefonemas de clubes que em determinada altura diziam, “devia acabar já”, mas após duas semanas já diziam, “isto não pode acabar agora”. Via isto com alguma normalidade, mas tinha de ir mantendo a coerência em relação aos clubes da Associação de Futebol de Angra do Heroísmo. Embora não tenha sido fácil, considero que correu bem.

O futuro do futebol açoriano está salvaguardado com o modelo que entra em vigor na campanha vindoura?

Muito sinceramente, acho que não. Este novo modelo não deve ser vinculativo, mas sim visto como uma transição. Vamos ver se vem acrescentar mais qualidade, sendo que a exigência por nós implementada já para a próxima época, no mínimo, organização vai trazer, de certeza. Na minha opinião, temos de acabar com o CFA, mas estou aqui para defender as opiniões e interesses dos meus clubes.

Quais foram, na sua perspetiva, os melhores e piores momentos da temporada 2020/2021?

O pior momento da época foi, sem dúvida, a primeira paragem que fizemos devido ao Covid-19. Lembro-me de contar as chamadas no meu telemóvel, foram 147 num só dia, no final do dia estava estoirado, estava extremamente preocupado com os atletas da formação, era devastador para mim saber que havia um atleta infetado e que, eventualmente, pudesse transmitir em cadeia. Parar a competição para mim nunca foi um problema, pois preferia ser acusado de excesso de zelo do que de despreocupado, principalmente com os filhos dos outros pais.

Já o melhor momento foi vencer o Torneio Regional Interassociações de Futebol sub-17, na Horta. Estava a assistir através do Youtube, e parecia um doidinho na minha sala, parecia até que estava a assistir ao euro 2016. Foi aquele sentimento de “estamos aqui!”. agora Ponta Delgada vai ter de levar connosco outra vez!

E depois vieram as vitorias dos sub-16, também no futebol, e dos sub-13 no futsal, já não ganhávamos assim há muitos anos.

Olhando para o futebol de formação, os clubes da Associação de Futebol de Angra do Heroísmo (AFAH) não conquistaram nenhum título em 2020/2021, mas, ao nível de seleções, as coisas foram diferentes, com a Terceira a somar alguns triunfos importantes. Nesta área específica, estamos a dar passos seguros para nos aproximarmos do topo regional?

Agora o paradigma mudou. Nas seleções temos dois técnicos muito competentes na formação, o Paulo Meneses e o Paulo Goulart, que sabem qual a linha a seguir para o êxito. São convocados atletas de vários clubes, sejam de equipas que ficam em primeiro, sejam de equipas que terminam em último, porque quem termina em último tem qualidade devido a um fator muito simples, dificuldade, quanto mais dificuldades tiveres na tua formação, melhor, quem quiser ser melhor tem de ultrapassar as adversidades. Tenho presente na minha memoria um exemplo muito simples, foi convocado um atleta para um estágio, um defesa central de uma equipa que vencia sempre com goleada, no treino da seleção o miúdo parecia um boneco, não sabia marcar, não recuperava, como se diz na gíria, era duro de rins, para se virar demorava uma eternidade. Porquê? Porque no seu clube, quando jogava contra outras equipas, essas mesmas equipas não passavam do meio campo. Como cresce um atleta destes?

Quanto ao futsal, o facto de a Série Açores passar a integrar o novo Campeonato Nacional da Terceira Divisão é uma forte machadada nas aspirações da modalidade?

O problema da serie Açores começa a ser outro, ou seja, demasiada representação da Associação de Futebol de Angra do Heroísmo está a matar a base da pirâmide. Agora vamos ter o SC Lusitânia na 2ª divisão, aí vamos ter a resposta que precisamos, apesar de ser contra este modelo, existe associações no continente em situação bem pior, que para participar na 3ª divisão, terão de disputar um play-off de acesso, enquanto que nos Açores, o campeão associativo sobe diretamente à 3 divisão.

Ao nível da formação, como é que analisa o trabalho que está a ser desenvolvido na área de jurisdição da AFAH na modalidade de futsal?

Depois dos recentes resultados regionais, penso que estamos a ficar demasiado cómodos, temos alguns treinadores com muita qualidade, mas temos outros que têm de pensar bem nos seus processos de formar atletas. Vai sair uma nova geração de treinadores no próximo curso ministrado pela AFAH e estamos esperançados de que possa acrescentar valor ao que já existe no nosso futsal.

O futebol e o futsal feminino podem reaparecer em força por estas paragens?

Temos atletas com muita qualidade. Por exemplo, a Festa do Futebol Feminino esteve a ser observada pelo Prof. Paisana da FPF, o qual confessou-me que temos miúdas com muito talento, houve até algumas atletas que ficaram referenciadas. A Associação de Futebol já fez a sua parte, por assim dizer. Tivemos o Centro de Treinos a funcionar dois anos, cativando mais atletas, permitindo que houvesse alguma evolução. Agora cabe aos clubes da Terceira decidir se querem futebol ou futsal, pois as atletas estão aí.

Na Graciosa e em São Jorge o futebol feminino está bem enraizado, sendo que na próxima época existe a possibilidade de passarem de futebol 7 para futebol 11, podendo assim participar com legitimidade nos apuramentos aos nacionais.

Qual é o relacionamento da AFAH com as restantes associações de futebol da região, Federação Portuguesa de Futebol, Governo Regional, autarquias e demais parceiros?

O relacionamento da AFAH com as restantes associações é excelente, com o objetivo de melhorar os quadros competitivos, para desenvolver o atleta açoriano, apesar de algumas vezes não haver unanimidade.

Com o Governo Regional está a melhorar, em relação ao que era no passado. O Prof. Licas (Diretor Regional do Desporto) tem uma visão diferente de como tudo deve funcionar, ninguém deve ficar indiferente aos milhões que foram investidos no desporto neste passar dos anos e a verdade é que nada evoluiu, parámos no tempo, e o novo Diretor Regional demonstra querer mudar o paradigma, temos a certeza que vai conseguir e estou aqui para o ajudar nesta difícil tarefa.

As autarquias têm sido parceiros fantásticos, sem elas era impossível termos as condições que temos. Existe uma relação de grande proximidade com todas, estando elas sempre prontas para colaborar em tudo o que esteja relacionado com os clubes da sua cidade.

São Jorge e Graciosa são cada vez mais parte ativa da vida associativa?

Sem dúvida. É com muito orgulho que vejo o aumento de atletas naquelas ilhas, clubes cada vez mais organizados, temos clubes certificados com duas estrelas, e o futebol feminino está em força nas duas ilhas, temos cada vez mais árbitros… Todo este desenvolvimento e organização deve-se, em muito boa parte, aos vice-presidentes presentes nas ilhas de São Jorge e Graciosa, o Raúl Brasil e o João Picanço, respetivamente.

O que é que podemos esperar da temporada 2021/2022?

Acima de tudo queria uma época de regresso à normalidade, onde conseguíssemos concluir todas as nossas competições.

Desejo, também, que exista um ambiente de paz e tranquilidade entre todos os protagonistas.

Temos o objetivo de aumentar o número de atletas. Estamos na ordem dos 2385 praticantes e gostávamos de chegar aos 2750. E esperamos conseguir fazer um trabalho de fundo nos quadros competitivos da formação.

Quanto a apoios aos clubes, vamos manter os atuais na próxima época, que se situam na ordem dos 175.000 euros, sendo, no entanto, a última em que usaremos o meio de distribuição existente. Ou seja, na época de 2022/2023 vamos passar a aplicar os apoios somente pelo número de atletas que cada clube tenha inscritos, pois um clube com duzentos atletas não pode continuar a receber o mesmo que um clube que tem vinte. Temos de prezar pela equidade.

Continua a sentir-se motivado para levar a bom porto o projeto que abraçou na AFAH?

Sim, continuo motivado, embora tenha de admitir que também me sinto cansado e, por vezes, sem tempo para a família. Esta época foi muito difícil e veio no seguimento de outra também muito complicada, ainda por cima existe algo que me entristece, que é a ingratidão, e o futebol neste aspeto é demasiado violento, apesar de ter a plena consciência de que estamos a fazer o melhor possível.

Sinto falta de estar num jogo na qualidade de simples adepto. Por exemplo, sinto falta de estar num lugar sem que ninguém fale de arbitragem, na maioria das vezes sem fundamento, a meu ver. Tudo isto cansa, mas temos de manter o nosso foco em prol das nossas modalidades e em defesa dos nossos filiados.

Estamos em ano de centenário da AFAH. Que iniciativas é que estão agendadas neste âmbito para os próximos tempos?

As comemorações dos 100 anos começaram há alguns meses com o programa “Viver a Estória”, onde documentamos as estórias na primeira pessoa pelos protagonistas. Assim, estas estórias não serão mais apagadas. Teremos a gala do centenário, no dia 04 de agosto, no Centro Cultural e de Congressos de Angra do Heroísmo, onde, entre outros momentos, iremos homenagear várias personalidades que marcaram o futebol e futsal da nossa associação, num momento único que se espera muito emotivo. A gala irá ser, efetivamente, um momento marcante, afinal são cem anos, um século.

Entrevista publicada no Diário Insular, a 05 de julho de 2021. Foto original de JEDGARDO VIEIRA/DI